segunda-feira, 25 de junho de 2012

Bicicleta (por Elineu Rosa Tomé)

Bicicleta
(por Elineu Rosa Tomé)

                  Era uma manhã mais do que clara, era luminosa e fresca. Cê sabe como é.
Quando se está confortável tanto por fora como por dentro? A luz da manhã entrando
no coração e vice-versa. Era um começo de dia assim, uma manhã dessas que a gente
tem saudade quando se recorda. Já todo arrumado para ir à escola com minha lancheira
municiada e pendurada ao ombro, uniforme escolar limpo e passado, cabelo repartido
ao meio, sentado no degrau rente à calçada, eu esperava. Acontecia de ser raro um dia
como aquele. Portanto eu fazia questão de aproveitá-lo, de dar valor, como dizem.
Impacientemente, porém diligentemente eu esperava a hora de ir para a escola na
bicicleta do pai. Contando assim parece banal, mas era único. Um dia com sabor e
cheiro, textura e cor. Eram sorrisos, risos, gargalhadas e infância. Muita infância. Na
cadeirinha da bicicleta entre meu pai e o guidão eu voava. Eu sei, eu sei que não saia do
chão, e chão de terra batida... Sei de tudo isso, mas eu voava. O mundo corria abaixo de
mim.
                    Ali e naquele momento não havia lugar para medo ou tristeza. Não tinha medo
nem do futuro. O que era o futuro? Desconhecia o conceito, o medo e o tempo. O que
me interessava era o presente do passeio ganho e o presente do tempo imediato. Era a
desforra do agora, do relógio parado no momento da festa. Apesar de ser pequenininho,
tanto no tamanho quanto na idade. Pequenininho também na noção das coisas, e talvez
por tudo isso ou apesar de tudo isso, eu não pensava na vida, como dizem. Uma das
melhores partes era não pensar nela, na vida. Pois então... Eu voava. Cê entendeu? Tá
certo que era numa bicicleta velha, num banquinho frouxo, numa rua de terra
esburacada, meu pai com pressa, meu pai cansado, meu pai trabalhando no turno da
noite, meu pai sem dinheiro... Desculpas... Eu não queria entrar nos detalhes. Pois que
no tempo do ocorrido eles realmente não faziam diferença.
                    Então eu voei, e voei com meu pai. Com o abraço do pai, a companhia do pai, a
risada do pai e a amizade de pai. Nada daria errado. Não tinha como dar errado. Eu
tinha fé em meu pai. Fé! Eu confiava nele, e confiava muito. Chegava à escola
perguntando se no dia seguinte ele viria novamente. Eu queria aquilo de novo e de novo
e de novo... Eu nem ouvia direito o “não sei, amanhã a gente vê”, eu era só alegria. Na
verdade eu estava feliz. Era um menino feliz.

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