segunda-feira, 25 de junho de 2012

Feriado (por Elineu Rosa Tomé)

Feriado
(por Elineu Rosa Tomé)


                          Parecia uma espécie de festa. Com jeito, sensação, cheiro de festa. Muita
criança, muitos meninos, uma molecada e eu no meio deles, misturado,
bagunçando, brincando, indo, indo de bicicleta. Todos nós tínhamos uma
bicicleta, pelo menos era assim que eu imaginava. Numa longa fila nem um
pouco organizada, feita de grupinhos de crianças, com olhos abertos,
escancarados, atentos, elétricos. Dia de sol, domingo de sol ou feriado. Isso! Era
um feriado. Um feriado grande, importante, dia da pátria ou coisa parecida. A
molecada como numa procissão seguia atrás da promessa de diversão, presentes
e quem sabe até de aventura. Todos se transformaram num lago de sorrisos
satisfeitos.
                          Enfrentamos a ladeira de terra até a entrada do sítio, que depois de
atravessar o que parecia uma infinidade de árvores compridas e finas,
chegávamos a um campo de futebol. As árvores cercavam com verde e sombra
todo aquele campo, toda aquela gente, todas aquelas bicicletas. Combinação
encaixada entre sol e sombra. Todos se tocavam, se esbarravam, se entendiam.
                          Eu só pensava que aquele dia não deveria ter fim. Então no meio do feriado, no meio da festa, entre tudo aquilo e todos aqueles, eu a vi. Linda, clara, iluminada
pela luz do sol que vencia as sombras das árvores. Tudo ficou diferente depois
da visão, depois dela. O som em volta diminuiu, a molecada toda perdera a cor,
todos ficaram em preto e branco. Mas na multidão cinzenta eu a via colorida. A
visão concentrava-se em seu rosto claro e no seu rosto claro, a sua boca vermelha
e na sua boca vermelha, seu sorriso branco. Acima do sorriso branco havia olhos
grandes e negros, emoldurados por sobrancelhas sem fim.
                          Hipnotizado, rendido entre empurrões e esbarrões, entre vozes e cheiro de
pipoca, tropeços e insegurança anestesiada, eu tentava mantê-la sob minha
vigilância. Não podia perdê-la na multidão, perdê-la para o tempo, para o depois.
O depois me ansiava. Sem me dar conta eu estava frente a frente com a visão.
                          Ela me olhou. Não sei como eu percebi que ela percebeu que eu a havia
percebido. E também não sei como num dia de felicidade, de festa, de feriado
grande, eu conheci a frustração. E então também percebi que ela fazia questão de
que eu percebesse que eu era um menino. Era um problema de tempo... Ela
mulher e eu menino. Contra minha vontade e sob meus protestos, o dia foi
terminando. Todos se foram, (não sei para onde) inclusive ela. Contrariado
aceitei que os momentos têm prazo de validade, vislumbrei que do tempo só
permanece aquilo que protegido descansa dentro. Dentro da gente, dentro do
peito. Só fica, resiste e transcende o tempo de dentro.

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